Os detratores de carros elétricos costumam tirar sarro de sua falta de barulho. Da autonomia baixa. De uma suposta falta de emoção ao dirigir. E exaltam V8s, carburadores e o cheiro de gasolina. Mal sabem eles que esse apego ao que estão acostumados é algo que sela o destino dos automóveis. Se eles não tivessem a opção de motores elétricos, teriam o mesmo destino das carruagens, dos cavalos e dos carburadores: um museu, clubes de campo ou, na melhor das hipóteses, um belo texto de José Luiz Vieira. Isso na melhor das hipóteses. Na pior, eles estariam fadados a desaparecer. Neste sentido, motores elétricos garantem a sobrevida do transporte individual. Mas as críticas continuarão, inclusive com o argumento de que baterias são um perigo maior ao ambiente do que os gases de escape. A questão é que nem só de baterias vive o elétrico. Há muitas outras maneiras de alimentar um carro com esse tipo de propulsão.
A maior aposta das fabricantes atualmente são as pilhas a combustível. Pesquisadas há décadas, elas ainda são muito caras, já que podem usar platina em sua composição, mas são o mundo ideal caso se tornem viáveis. Isso porque elas são absolutamente limpas. Para funcionar, elas usam hidrogênio, um dos elementos mais abundantes da natureza, e fazem com que ele reaja com oxigênio. Essa reação produz H2O, que você também conhece como monóxido de di-hidrogênio ou simplesmente como água, e eletricidade. Sem qualquer elemento tóxico no processo.
O problema quanto à pilha a combustível é que muitas empresas querem usá-las como um substituto puro e simples do motor a combustão, o que exigiria que elas fossem enormes, ampliando ainda mais a desvantagem de custo. É a receita adotada pelos fabricantes tradicionais, como a Toyota, com o Mirai, e a Hyundai, com o Nexo. Uma alternativa a isso é ter pilhas grandes, mas mais baratas. É nisso que a Nissan acredita com a SOFC, ou Solid Oxide Fuel Cell, a pilha a combustível de óxido sólido. Sem metais raros, ela é muito mais barata, como mostra abaixo a imagem de como é a SOFC e as pilhas a combustível mais comuns.
Em qualquer um dos casos, seja com a SOFC, seja com a pilha a combustível mais utilizada, será preciso abastecer as pilhas com hidrogênio. Ele pode ser fornecido em estado puro, uma dificuldade enorme, considerando as pressões em que o gás tem de ser armazenado ou a temperatura baixíssima para que ele seja usado em estado líquido, e extraído de combustíveis comuns, como gasolina ou etanol. Isso acontece por meio de um reformador, um equipamento que extrai hidrogênio do combustível e libera gás carbônico para a atmosfera. Daí o foco em usar combustíveis renováveis na empreitada. Se os reformadores trabalhassem com combustíveis fósseis, eles trariam o mesmo problema dos motores a combustão, ainda que com um aproveitamento melhor da energia química contida neles.
De todo modo, há uma empresa com uma ideia muito diferente para essa fonte de eletricidade: a Riversimple. Há longas explicações sobre a proposta da empresa na internet, mas, de modo resumido, ela propõe um carro mais leve, com uma pilha consequentemente menor, e supercapacitores para acelerações vigorosas. Esses supercapacitores são uma outra forma de acumular energia no lugar das baterias. Ainda que segurem carga por menos tempo, eles a liberam muito mais rapidamente. Eles são usados principalmente para armazenar energia das frenagens regenerativas.
Outra fonte de energia para carros elétricos poderia estar em estradas e ruas eletrificadas. A energia viria por sistemas de indução ou mesmo por trilhos, como em carros de autorama. A dificuldade óbvia deste tipo de solução é a necessidade de mudar toda a infraestrutura para estes sistemas de fornecimento de eletricidade. Mais do que isso, a criação de um padrão de recarga único para todos os veículos, o que dependerá da adesão dos consumidores ao que for mais conveniente e não obrigatoriamente o melhor, como aconteceu com o VHS em vez do Betamax nos tempos de videocassete.
Por fim, pode-se usar motores a combustão como geradores de energia para os motores elétricos. O sistema e-Power, da Nissan, já faz exatamente isso no Japão e conseguiu o primeiro lugar em vendas com a solução, aplicada ao Nissan Note. Mas qual é o sentido de usar um motor a combustão para gerar eletricidade? Não seria muito mais prático usá-lo simplesmente para a tração? Até poderia ser, mas não seria nada eficiente. Como não é eficiente usá-los deste modo atualmente. Ao ficar livre de ter de impulsionar o veículo, o motor a combustão pode funcionar sempre da melhor maneira, em sua faixa de rotações ideal, de modo contínuo. Com isso, ele consegue ser muito mais econômico do que se ficasse condicionado a mover o carro. O Note e-Power apresenta um consumo de combustível de 37,2 km/l! Melhor que o dos melhores motores diesel disponíveis atualmente. E até do que muitos híbridos, como o Toyota Prius.
O sistema e-Power usa motores a combustão reciprocantes, ou seja, com pistões, para poder gerar energia, mas há gente apostando em motores a combustão ainda mais eficientes do que eles, as turbinas, que aproveitam até 60% da energia química, algo que os motores atuais apenas sonham em conseguir. Para se ter ideia do que isso representa, a Toyota comemora que os motores Dynamic Force conseguem aproveitar 40% das calorias fornecidas pelos combustíveis e a Mazda tem a meta de levar essa eficiência a 56%. Algum dia...
Por fim, mesmo as baterias devem ser muito diferentes das que conhecemos atualmente, de íons de lítio. Honda, Toyota e Nissan já pesquisam em conjunto as que são consideradas de próxima geração, chamadas solid state. Elas são mais leves, resistentes, podem ser carregadas muito mais rapidamente e não usam metais raros nem elementos tóxicos, o que as torna muito mais corretas de um ponto de vista ambiental.
Resumindo, quando alguém criticar os elétricos, que seja por qualquer uma das razões que apontamos no começo deste texto, todas absolutamente subjetivas, como mostra o Rimac C_TWO, a não ser pela autonomia baixa, que já passa, na média, dos 300 km, e pela questão ambiental. Novas baterias, ou mesmo outras fontes de energia elétrica, devem tornar o fim dos motores a combustão ainda mais rápido do que se esperava. A não ser que sejam eles a fornecer a energia elétrica de que os novos motores precisam.